Carta às mães (de gêmeos)

Depois de passar por fases difíceis da gravidez e do pós-parto, sempre pensava como teria sido bom se eu tivesse me informado melhor sobre algumas coisas, me preparado mais para alguns momentos e me conscientizado um pouco sobre algumas fragilidades femininas. Queria ter falado mais sobre certos assuntos, ter ouvido mais experiências reais de pessoas próximas, ter focado em coisas mais substanciais da vida da recém mãe e do recém nascido, ter ouvido mais conselhos da minha própria mãe, ter buscado menos teoria e ciência e mais sentimento e essência do que vivia e viveria a partir dali.

É verdade que muito ensinamento só é internalizado quando se está vivendo o momento e sentindo na pele as situações. Mesmo assim eu sinto que poderia ter me preparado para as mudanças e reviravoltas da minha vida de maneira diferente….

Quando se está grávida, muita energia é colocada na preparação do enxoval e na preparação para o parto.

Ensaio Priscila e Pablo-Alta-143-9749

Eu me preocupei muito com o enxoval da Isabela e da Laura. Primeiro por ser mãe de primeira viagem e depois por se tratarem de dois bebês, o que agregava algumas dificuldades a essa logística.

Logo que as meninas nasceram, percebi quão poucas coisas materiais elas precisavam. Não importava a marca do macacão, do carrinho, da fralda, nem a quantidade de bodies, calças e cueiros, muito menos se o laço e o sapatinho combinavam perfeitamente com a roupinha. O que realmente fazia diferença era o colo que acalmava, o peito que alimentava, o cuidado que protegia, a disponibilidade e a doação que acolhiam; o crucial era se conectar com aqueles seres indefesos para então começar a ter alguma ideia das suas reais necessidades, que não, nunca se ligavam a nada material.

Outra constante no meu pensamento de gestante era o parto. Passei longo tempo procurando informações e tentando encontrar médicos com os quais me identificasse e que respeitassem minha ideia de parto humanizado e natural (ainda que alguns considerassem gravidez gemelar como gravidez de risco, mesmo sem qualquer indicativo para tanto!). Foram longas esperas em diferentes consultórios até chegar à escolha que considerei ideal; muitas dúvidas sobre ser ou não acompanhada por uma doula; nos meses finais, foi grande a expectativa para que as meninas encaixassem e ficassem na posição que permitiria aquele parto.

Quando uma das bolsas estourou com quase 34 semanas de gestação, eu senti como se vários sonhos escorressem pelas minhas mãos. Não me preparei para a possibilidade de um parto prematuro, nem sabia do que se tratava um ambiente de UTI Neonatal. O parto pré termo não foi impeditivo para o parto normal já que eu entrei em franco trabalho de parto e atingi dilatação total; o que impediu meu parto foi a minha insegurança com relação a um parto gemelar pélvico, que é um parto mais melindroso, especialmente em se tratando de gêmeos; foi isso que me empurrou para a cesárea. No meu contexto, foi uma cesárea bem sucedida. As meninas nasceram saudáveis, embora não da forma livre, acolhedora, amorosa que eu sonhei.

Eu mal sabia que meu maior desafio não era o parto em si, mas tudo o que me aguardava depois dele.

Queria ter me preparado mais para a possibilidade de as meninas nascerem prematuras, para não me assustar tanto, nem ficar tão deslocada dentro da minha própria vida.

Teria feito muita diferença se eu tivesse me informado mais sobre a amamentação, em especial a amamentação de gêmeos. Esse é um assunto que é tão ou mais importante que o parto. Saber previamente das dificuldades e inseguranças que outras mães enfrentam me ajudaria muito a não me sentir tão inapropriada nos meus medos e dúvidas.

Entender mais do corpo da mulher no pós-parto também teria me ajudado a superar conflitos pessoais, a respeitar mais esse momento tão importante e a ser mais compreensiva comigo mesma e com as minhas limitações.

Saber que quando nasce um filho, não nasce uma mãe pronta e acabada, mas que essa é uma construção para a vida toda, colocaria menos pressão sobre os meus ombros.

Seria fundamental entender que logo depois de ter bebê é normal se sentir triste, solitária e perdida, e que isso não tira nada do nosso valor e do nosso mérito como mãe, que somos sim a melhor mãe que nosso bebê pode ter.

Compreender e aceitar que, no puerpério, a mulher não pode estar sozinha, que não é natural ser deixada a própria sorte com o recém nascido e que, não, não temos que dar conta de tudo, tornaria o momento mais leve. Talvez eu tivesse buscado mais ajuda, na família ou fora dela.

Eu queria, principalmente, ter ouvido minha mãe e outras pessoas próximas quando diziam que tudo isso passa, que você se fortalece a cada dia e que ficam apenas histórias para contar.

Eu queria ter ouvido essas coisas de alguém. Queria conversas francas e diretas sobre esses assuntos importantes, sem floreios nem meias verdades. Idealizações e ficções sobre a maternidade não ajudam em nada, ao contrário, tornam ainda mais tortuoso o caminho.

Eu escrevo isso hoje com a vontade de ter escrito para mim mesma, lá atrás, antes de começar a viver tudo o que vivi. Queria dizer para aquela grávida de gêmeos para ela cuidar dela mesma e do seu interior, porque com o nascimento dos seus bebês começaria uma missão difícil, que demandaria todas as suas forças e que a colocaria muitas vezes em prova; mas para ela procurar ficar tranquila, porque nada seria além das suas capacidades e todos ficariam bem; que as fases passam, as dificuldades são superadas e, quando se olha para trás, é muito grande a satisfação do dever cumprido e de tanto amor construído.

 

4 comentários sobre “Carta às mães (de gêmeos)

  1. Lindo texto! Emocionante. Colocaste em simples palavras a tarefa árdua e gratificante de ser mãe de gêmeos. Cada palavra parecia me descrever. Parabéns !

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