Eis que, depois de quase dois anos e meio, viajamos sem Isabela e Laura.
Foi a primeira vez, em todo esse tempo, que ficamos sem ver as duas por mais de 24h.
Até então, todos os dias incluíam as meninas, nossa rotina e a vida que construímos desde sua chegada.
Planejar essa viagem já foi um desafio em si: Quantos dias? Não é muito tempo? Ou será pouco tempo? Onde vamos? Não é muito longe? O que vamos fazer? Será que vai ser bom? Vamos conseguir aproveitar? E a saudade? Elas ficarão bem? Será que vão sofrer muito? As pessoas que ficam vão conseguir atendê-las? E se elas ficarem doente?
Nenhum pensamento ficou a salvo. Todos passaram pela cabeça.
A viagem foi planejada em tempo recorde: em questão de horas, durante uma conversa em uma sexta-feira à noite, decidimos o destino, compramos passagem e reservamos hotéis. Talvez, se enrolássemos muito, aumentaria o risco de desistir. Sempre parece mais fácil ficar na zona de conforto…
Depois de tudo fechado, um olha para a cara do outro meio desconfiado e apavorado, como se perguntando: o que foi isso? que diabos estamos fazendo?
Como a viagem aconteceria certo tempo depois, deixamos a ideia esfriar para repensar as coisas mais próximas da data. No meio tempo, acertamos os detalhes da rotina das meninas na nossa ausência (listas e mais listas com todo tipo de instruções, mesmo em tempos de comunicação ao vivo e a cores), garantimos cuidadoras muito especiais (vovós de plantão com auxílio da babá) e decidimos os detalhes finais da viagem.
Chegada a semana da viagem, aqueles pensamentos lá do início voltaram a toda. A coisa era concreta e estava prestes a acontecer.
A semana passou voando. Quando menos percebemos, estávamos os dois no aeroporto de mala em punho. Sozinhos. So-zi-nhos (isso já soava deveras estanho.rs).
Todo o processo de check in, raio x e embarque foi tão ágil, que me trouxe uma memória muito viva daqueles tempos longínquos em que eu não tinha ideia do que era viajar com filhos.
No avião, vôo tranqüilo, conversamos, dormimos… tudo sem interrupção. A não ser pelo choro do bebê do assento vizinho, que me encheu de solidariedade por aquela mãe (#tamojunta)!
Chegamos no primeiro destino e seguimos viagem de carro. Mais conversas, risadas, planos. Só com essas primeiras impressões, já foi possível perceber que no dia a dia, na rotina nossa de cada dia, nossa comunicação é muito, mas muito prejudicada. Poderia até dizer que não conversamos, não uma conversa verdadeira, despreocupada, sem interrupção, sem pressa…
Os dias se seguiram e lá estávamos nós fazendo programas adultos, tendo conversas bacanas, vivendo momentos sem pressa e sem compromissos inadiáveis…
Comer e dormir foram pontos altos. Depois que se tem filhos, essas ações se tornam alvos fáceis de interrupções e acabam solenemente relegadas a segundo plano. Pois, durante a viagem, comemos comida quente e dormimos até a hora que queríamos (no meu caso, não exatamente! Percebi que, mesmo que as meninas não estejam por perto, meu sono é uma grande droga e, apesar de querer dormir até meio dia, acordo as 8h da madrugada! #porque,Senhor?! P.S.: Ao menos era sem interrupção.).
A saudade, preocupação e insegurança por ter deixado as meninas em casa era grande em um primeiro momento, mas foi se acalmando até passar a níveis saudáveis e tranquilos, facilmente contornáveis com uma ligação ou chamada de vídeo.
Administramos muito bem a saudade e a distância. O processo foi leve e natural.
As meninas também se comportaram exemplarmente. Isso segundo os relatos das avós (ainda me pergunto um pouco em que medida elas estavam realmente nos falando a verdade dos fatos ou colocando panos quentes sobre alguma situação desconfortável, já que não teríamos muito o que fazer à distância)…
Olhas as fotos que recebíamos. Zero cara de sofrimento…
Esgotamos nosso roteiro turístico. Comemos bem. Dormimos um monte. Passeamos. Nos divertimos. Conversamos. Conhecemos lugares e pessoas. Tivemos experiências novas. Resgatamos lembranças e sentimentos. Encontramos novos pontos de conexão.
Foi uma experiência com um saldo mais do que positivo.
Poderia fazer uma longa lista das vantagens, conquistas e descobertas dessa nossa vivência. Mas, de todas elas , a mais importante foi uma em especial: resgatar a certeza de que, mesmo depois dos filhos, continuamos sendo indivíduos únicos, com vontades, ambições, necessidades e interesses próprios, que vão muito além das nossas responsabilidades e funções enquanto pai/mãe. E isso nada diz sobre o tipo de pai/mãe que somos, mas fala unicamente sobre nós enquanto pessoas, homem ou mulher, ser humano falível, singular, que carrega em si um universo e não pode nem deve ser delimitado ou aprisionado por um de seus papéis. Antes de sermos pai/mãe, fomos muitas outras coisas; depois dos filhos, continuamos sendo e não podemos nunca perder isso de vista…